Relato de hospital #19
RESPIRO... por Edran Mariano - Diretor Artístico

Estavam sentados um pai, e um filho.
Lado a lado.
Olhares tristes, distantes, desacorçoados, perdidos, esperando...
Silêncio no corredor.
Mesmo com toda a movimentação de enfermeiros e funcionários, o silêncio ali permanecia presente.
Uma porta se abre ... dois palhaços de trás dela surgem.
E ali dentro, um pai e um filho, sentados num corredor de hospital, com olhar distante.
Os palhaços se aproximam.
A porta se abre novamente, e dela se vê o aparecimento de mais dois palhaços.
E ali sentado no banco um filho, agora com um olhar querendo entender o que há por detrás daquela porta de onde não paravam de surgir palhaços. E um pai cabisbaixo.
Silêncio.
Olhares! Um para o outro. Como quem busca algo para iniciar uma relação.
Silêncio.
A porta ...
Sim!
Mais dois palhaços dela surgem. E junto com eles uma música.
Ali dentro um filho sentado sem entender o que estava acontecendo. E um pai que nesse momento levanta os olhos, e com um semblante de quem se lembra de algo bom, diz:
- Eu gosto de Milionário e José Rico. Sei mais de 40 músicas deles...
Assim começou o show! Uma coletânea das canções de Milionário e José Rico, no corredor do Hospital Cajuru dia 12 de agosto, véspera de dia dos pais, onde sentados estavam um pai e um filho, esperando.
Esperando o que?
Uma resposta? Um diagnóstico? Um parecer?
Ainda não sabemos o que esperavam esse pai e esse filho. E nessa altura já estávamos ouvindo a quinta música de um repertório de 40, um pout pourri de Milionário e José Rico, na voz do pai que ali estava sentado.
Entre aplausos e vibração, ao final de mais uma canção, entoada com uma voz forte e de quem carrega esse repertório a muito tempo, um doutor-palhaço diz: - Você não é o Milionário e José Rico, mas vai ficar milionário fazendo shows, você vai ver.
Todos os palhaços concordam!!!
E assim segue-se mais uma música.
A porta.
Se abre.
Atrás dela, uma moça, olhos cheios de lágrimas. Adentra o corredor e senta ao lado do pai. Eles se olham. O pai com um ar prazeroso, como de quem faz algo que gosta muito. Ela, a filha, semblante preocupado, emocionada, olhar que pede ajuda. E o filho ainda tentando entender o que estava acontecendo diante de seus olhos.
Silêncio...
Lagrimas correm pelo rosto da filha.
O pai recomeça uma nova música, também de Milionário e José Rico. Uma música mais calma. Que vai envolvendo todos os presentes, e agora também a filha, que tem um frescor em seu rosto, onde as lagrimas dão espaço a um brilho em seu olhar.
Um respiro...
Os palhaços seguem rumo a novos corredores e novos encontros.
Fôlego.
O pai finaliza a cantoria.
O filho observa...
A filha ... respira. E passado alguns segundos, diz: - A médica disse que ela tem pouca chance de sobreviver!
Silêncio.
O Pai fala: - será que o pessoal do hospital vai ficar bravo com a gente, por causa da cantoria?
Silêncio!
Respiro.
Esperam...